Rubens Neiva
JUIZ DE FORA (MG)
Chega ao mercado no segundo semestre de 2020 o Volutech, equipamento que utiliza sensores para medir com precisão o volume de leite armazenado nos tanques de resfriamento. Desenvolvida pela startup mineira de mesmo nome, situada em Viçosa, a inovação surgiu do Desafio de Startups promovido pela Embrapa Gado de Leite (MG) para incrementar o chamado ‘Leite 4.0’. A tecnologia substitui as réguas de medição, instáveis na apuração do volume real do produto, e é capaz de impactar em ganhos econômicos para produtores e laticínios.
Com cerca de vinte centímetros de comprimento, o equipamento possui sensores que enviam informações para um servidor remoto com acesso a laticínios e produtores. A ferramenta é instalada na tampa dos tanques de resfriamento e também é capaz de registrar a temperatura do leite em diversos períodos do dia, os momentos em que o tanque foi aberto e se ocorreram picos de energia durante o resfriamento – o que pode fazer com que a temperatura varie, comprometendo a qualidade do produto.
O ERRO
Para se ter uma ideia, o erro de um centímetro na régua de medição pode equivaler a três litros de leite por tanque. “Considerando que o Brasil tenha 500 mil produtores com tanque de expansão, isso significa 1,5 milhão de litros de leite que podem estar sendo contabilizados pelos laticínios sem terem sido de fato recolhidos dos tanques”, explica Gustavo Duque, diretor da Volutech e estudante de Agronomia na Universidade Federal de Viçosa (UFV). “O maior produtor de leite do País pode ser o erro da régua”, brinca o estudante.
O supervisor dos campos experimentais da Embrapa Gado de Leite, Armando Carvalho, diz que o equipamento é uma ferramenta útil tanto para produtores quanto para indústrias de laticínios e tem um grande apelo mercadológico. “A medição com a régua convencional é um problema grave para a indústria e para o produtor, já que ambos têm interesse em saber o volume real do leite que será captado”, relata Carvalho ressaltando que, se o tanque não estiver nivelado adequadamente, a medição com a régua torna-se imprecisa
ALTA TECNOLOGIA A BAIXO CUSTO
O Volutech terá baixo custo e os laticínios serão os principais clientes. Tanques de grande capacidade já possuem a medição eletrônica, mas, segundo Carvalho, estão fora do alcance dos pequenos e médios produtores, além de não possuir o mesmo nível de conectividade e interatividade. “O novo equipamento será o primeiro a entrar no mercado tendo esse público como foco”, destaca Sávio Filho, diretor de vendas da Volutech, que conclui no próximo ano o curso de Medicina Veterinária da UFV.
O equipamento está em fase final de testes para entrar no mercado com todos os ajustes concluídos. Os experimentos estão sendo realizados em quatro fazendas. Três delas estão em Minas Gerais e fornecem leite para o laticínio da UFV, onde a maior parte dos membros da startup estuda ou se formou. Parte da equipe integra o programa Família do Leite, promovido pela universidade.
A INOVAÇÃO
A aproximação entre a pesquisa agropecuária e as universidades é um dos principais objetivos do Ideas for Milk, cuja primeira edição ocorreu em 2016. Além do hackathon e do Desafio de Startups, o evento conta com a Caravana 4.0, na qual pesquisadores e analistas da Embrapa Gado de Leite percorrem universidades em todo o País ministrando palestras sobre a importância das novas tecnologias no agronegócio.
O chefe-adjunto de Transferência de Tecnologias da Embrapa Gado de Leite, Bruno Carvalho, diz que existe muito espaço para as novas tecnologias no agronegócio do leite. “A cadeia produtiva do leite está aberta ao dinamismo dessa geração que nasceu no contexto das inovações digitais, com grande capacidade de apresentar novas soluções para os velhos problemas do agro”, acredita.
IDEIA SURGIU NA COMPETIÇÃO
“A ideia de criarmos o produto surgiu durante o hackathon (chamado de Vacathon) promovido pela Embrapa em 2018”, conta Sávio Filho. Os estudantes investiram no projeto e, no ano seguinte, o equipamento estava pronto para participar do Desafio de Startups da Embrapa.
De acordo com os próprios estudantes, ao se inscrever no Vacathon, a equipe não tinha noção alguma de qual projeto apresentaria. “Foi na visita ao campo experimental da Embrapa Gado de Leite que a ideia surgiu”, relembra Lucas Sanders, estudante de Engenharia Elétrica da UFV, um dos membros da startup. “Ao ver o funcionamento do tanque de expansão, a gente se perguntou sobre como um equipamento tão caro poderia ser tão vulnerável na apuração do volume de leite”, relata. Com o apoio do grupo de mentores do Vacathon, formado por pesquisadores e analistas da Embrapa, a ideia foi ganhando corpo. No quinto dia de hackathon, a equipe já tinha o projeto desenvolvido e o nome do produto. “Não fomos os vencedores, mas ficamos selecionados entre os melhores projetos e saímos do evento da Embrapa motivados a tornar a ferramenta uma realidade”, conta o estudante.
Para o diretor de vendas da Volutech, o evento da Embrapa foi fundamental: “Começamos no Vacathon e terminamos vencendo o Desafio de Startups; a Embrapa Gado de Leite esteve presente em todo o processo, do nascimento da startup à apresentação do produto para a cadeia produtiva.” Após o Vacathon, a equipe passou por uma pré-incubação no Centro Tecnológico de Desenvolvimento Regional de Viçosa – incubadora de empresa da UFV (Centev). Agora, os empreendedores estão finalizando o processo de patenteamento do Volutech no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI).
A INOVAÇÃO DO VOLUTECH
Para entender como o Volutech funciona, é preciso saber como o leite é armazenado e de que forma é feita a coleta nos tanques de resfriamento pelos laticínios. (Da Embrapa Gado de Leite)
A coleta do leite em cinco passos:
1º – Depois de ordenhado (com ordenhadeira mecânica), o leite é bombeado por meio de dutos até o tanque. Lá, o produto é refrigerado a cerca de 4° Celsius.
2º - A cada um ou dois dias, o caminhão do laticínio, que possui um tanque isotérmico para preservar a temperatura do leite, vai à fazenda fazer a coleta.
3º - O motorista do caminhão faz as análises necessárias e calcula, por meio da régua do tanque, a altura da coluna de leite.
4º - Cálculos feitos a partir de uma tabela própria darão como resultado o volume a ser coletado, que será anotado e informado ao laticínio.
5º - Com o produto transferido para o tanque isotérmico do caminhão, misturado ao leite de outras fazendas, o caminhão segue sua rota.
Cinco problemas que o equipamento resolve:
1º - Tanque mal nivelado – o desnivelamento do tanque ocorre durante a instalação em uma base de alvenaria malfeita. Um desnível que altere um centímetro na coluna do leite pode representar alterações de cerca de três litros de leite para mais ou para menos.
2º - Picos de luz – Quedas de energia interferem no resfriamento do leite e a temperatura inadequada favorece o aumento da contagem bacteriana, interferindo na qualidade do produto. O Volutech registra picos de luz e o tempo em o leite deixou de ser refrigerado, fornecendo informação para tomada de decisão de laticínios e produtores.
3º - Roubo de leite na propriedade – Não é incomum ocorrerem furtos de leite na propriedade. O Volutech informa não só a hora que a ordenha foi feita, mas também o momento em que o tanque é aberto, tornando possível registrar qualquer tipo de sinistro.
4º - Fraude na medição – Mudar a posição ou o ângulo da régua que mede a coluna do leite é uma maneira de fraudar o volume. Com a medida realizada por sensores, esse tipo de fraude deixa de ser possível.
5º - Perda de tempo – O equipamento torna o trabalho mais ágil, pois simplifica o processo. Supondo que o motorista do laticínio demore cerca de cinco minutos para fazer a leitura do volume do leite e que isso se repita em 15 propriedades, ao longo do dia serão necessários uma hora e quinze minutos. Um tempo que pode ser economizado com a leitura digital.
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